Nesta segunda parte do artigo, continuamos a analisar a PS Vita. Haverá ainda esperança para a consola?
Para qualquer Gamer a PS Vita é um sonho tornado realidade: uma consola portátil capaz de entregar performance (quase) ao nível de uma consola de mesa. No seu catálogo tem jogos capazes de mostrar bem o poder da consola e ainda há muito potencial por descobrir. Infelizmente o investimento parece não ter dado retorno e de acordo com declarações recentes do vice-presidente sénior da Sony a consola não tem qualquer título em desenvolvimento, por parte dos estúdios internos. É pena, pois a capacidade de entregar jogos ao nível de uma consola de mesa é uma das suas melhores características.
Será que podia ter sido feito mais?
Uma loja com falta de produtos
A loja é um dos grandes falhanços da consola. Para aqueles que não sabem, a Vita para além dos títulos feitos para a consola possui compatibilidade com títulos PS1 e PSP. E há muitos jogos fantásticos destas plataformas à venda na loja, desde os clássicos Tomb Raider, Resident Evil ou o primeiro MSG, a excelentes títulos da PSP, como God of War Chains of Olympus ou Pursuit Force. O problema… são os títulos que não estão lá. Em 2014 aconteceu uma situação ridícula, que me revelou o quão a Sony tem deixado escapar oportunidades. A Konami (a brilhante companhia que conseguiu dar cabo de um dos projetos mais aguardados da nova geração), anunciou Silent Hill Origins e Silent Hill Shattered Memories para a PS Vita. A Internet entrou em rebuliço. Eu, que joguei Origins (não consegui acabar devido a uma avaria na minha PSP), fiquei extasiado, como muitos possuidores de uma Vita, que já conheciam o título, uma verdadeira pérola na PSP. Shattered Memories, com a sua mecânica inovadora, iria cair que nem uma luva na consola e tirar verdadeiro partido das suas funcionalidades. Mas a Konami enganou-se. Afinal, o que queria dizer era que a versão digital desses jogos (na PSP) iria ficar disponível na PS Store. Foi um balde àgua fria, confesso, mas pronto, tudo bem, pelo menos iria poder, finalmente terminar o jogo. Mal o jogo saiu fui comprá-lo através da PS3. Ainda hoje lá está.
É que, apesar de ter sido noticiado na Eurogamer.pt, e a Konami ter realmente disponibilizado o jogo e o mesmo estar na disponível na PS Store portuguesa (para a PSP, pormenor que me falhou na altura), a versão não corre nem é reconhecida pela Vita. Eu não sabia que ao contrário das versões físicas, os títulos digitais não eram region free. Fiquei a saber. Descobri também algo ainda mais surpreendente: há títulos presentes apenas em determinadas regiões e há títulos que apesar de compatíveis com a consola, não aparecem na loja da Vita, mas aparecem na PS3. Para uma consola que precisa desesperadamente de vender mais e de vendas digitais, isto é algo que não entendo.
Uma das principais queixas apresentada por Shuhei Yoshida quando referiu que uma sucessora para a Vita não seria viável, foi o facto de a Sony não ter capacidade de responder à enorme variedade de oferta que as lojas do iOS e Android oferecem. Não entendi. A verdade é que catálogo para a Sony encher a loja de vários jogos e disponibilizá-los a preços semelhantes à lojas do iOS e Android não falta (sobretudo os da geração PS1 e há muitos que não estão lá). Pode faltar é vontade.
Retrocompatibilidade… ou remakes?
Esta experiencia toda com os enganos da Konami também me levou a reflectir sobe o quão sem sentido a retrocompatibilidade com a PSP era. Em primeiro porque já por si é incompleta. Em segundo porque não há forma de o formato físico correr na Vita. E em terceiro, porque merecem o upgrade visual de um remake (os originais não ficam nada bem no OLED) e suporte total aos comandos da portátil. Gostaria de ver God of War Chains of Olympus ou Motorstorm Artic Edge a correrem, tirando todo o partido do hardware da Vita, incluindo gráficos renovados e o segundo manípulo analógico a servir para alguma coisa. E não, não acredito que as vendas desses jogos na PSP, via online, justifiquem a sua presença na loja, para compensar anteriores jogadores (sobretudo porque o catálogo está incompleto). A PSP Go foi um fracasso tremendo. A iniciativa teria dado, a preço mais baixo, um conjunto de grandes títulos para a Vita que não só tirariam bom proveito do seu hardware, como ofereceriam melhor experiência. Dava mais motivos às pessoas para os comprar e compunham o catálogo da consola. E sobretudo, permitiriam fazer jogos a custo mais baixo, aumentando a oferta.
Do mesmo modo, acredito que a Sony poderia ir mais longe e recuperar pérolas da geração PS2 para a Vita. Já o fez com os dois primeiros God of War. A Konami fez o mesmo com MSG II e III. Títulos como Tomb Raider Anniversary, Tomb Raider Legend, 24 the Game, Black, Fahrenheit, Mark of Cry, Destroy all Humans!, Resident Evil Dead Aim seriam adições muito bem vindas! Entre muitas outras. Além disso, há alguns jogos dessa geração que até poderiam ter uma nova oportunidade, que as limitações dessa geração não lhes puderam dar.
Começemos por Tomb Raider: Angel of Darkness. Este título, um exclusivo para a PS2 que ainda detém o título de pior entrega da série, sofreu um desenvolvimento muito turbulento e representou a saída de cena da Core Design no desenvolvimento da franquia. A equipa não conseguiu lidar com a pressão dos prazos, a dificuldade da nova arquitetura e o desenvolvimento de novas tecnologias ao nível da geração que acabava de chegar. O jogo contudo ganhou um estatuto de culto. Muitos fãs ainda hoje o estão a estudar e descobrem cada vez mais segredos sobre o que o jogo poderia ter sido, sobre as mecânicas que estavam em desenvolvimento e sobre a verdadeira dimensão que inicialmente se queria dar ao jogo, revelando um título que, se tivesse sido concretizado, teria quebrado todas as barreiras. Num artigo recente no Ars Technica, anteriores membros do estúdio falaram sobre o que se passou e exprimiram a vontade que tinham em poder acabar o jogo. Neste momento, a Square Enix tem os direitos e a Crystal Dynamics está no controlo da série e levou-a numa direção nova e completamente diferente. Por isso uma entrega dessas ao nível de uma consola de mesa ou PC está fora de questão… Mas de um dispositivo como a Vita? Porque não? Seria a oportunidade ideal para acabar o jogo, e um excelente título, chamativo, para o catálogo da portátil.
Outro título que faria todo o sentido seria Resident Evil: Outbreak. Foi a primeira entrega da série a entrar no multijogador online, e a verdade é que a ideia não era nada má! Combinando a jogabilidade dos clássicos (os controlos tipo tanque) e a sua atmosfera, vários jogadores juntam-se para explorarem os vários cenários (Hive, Hospital, um Zoo) como sobreviventes, tentando encontrar os segredos (sim, porque a série costumava ter puzzles) e sobreviver até ao final da noite, enquanto combatem zombies (de todas as espécies incluindo um elefante) e as mais diversas aberrações. Na altura, as limitações e fraca qualidade da tecnologia na PS2 não permitiram ao jogo um grande impacto. Mas agora? Com o nível de hoje? Agora acredito que seria um jogo capaz de fazer a diferença. E esta opinião não é só minha, já que existe um rumor (no qual não acredito) que aponta para uma nova entrega na série chamada Resident Evil Outbreak: Tall Oaks, para a Vita…
Joguei os clássicos da PS1 todos na Vita, e caem-lhe que nem uma luva dando sentido à consola. Estes dois títulos mantém o charme dos originais, com gráficos à altura dos potenciais da consola e a beleza do controlo dos clássicos, que se adaptam muito bem ao design da Vita. Como estes, muitos outros jogos da geração PS2 poderiam ter uma nova vida na portátil. War of the Monsters, um título de luta em que os nossos lutadores são monstros do cinema, é um deles. O jogo não teve muito sucesso, mas com novas mecânicas e sobretudo com a componente online, poderia ter uma nova vida.
Bundle PS4 e PS Vita, a oportunidade perdida
Quando a nova consola da Sony foi lançada, o remote play foi amplamente divulgado (depois do enorme fracasso que foi a implantação da funcionalidade na PS3). Tanto que a Sony esperava que houvesse uma inversão da tendência e a Vita começasse a vender (suspeito que os preços dos cartões de memória fizeram muitos mudar de ideias), e para tal chegou a lançar uma nova versão da consola, com novas cores e novos títulos.
O que realmente os fãs queriam era um bundle, que juntava a PS4 à PS Vita. E faria todo o sentido permitindo unir as plataformas na funcionalidade remote play e ao mesmo tempo permitir à Vita mais vendas. E este último ano que passou provou que há suficiente boa-vontade no mercado para acolher uma iniciativa destas, portanto porque não? A consola está mais barata, e por isso seria uma perda de 50$ com a Vita se o preço fosse de 500€ (com o modelo da PS4 de 350$). Ao nível a que a PS4 vende, seria extremamente benéfico para divulgar a Vita e fazer as pessoas dar uma oportunidade à consola, face à pressão Android/iOS. Ganhado mais público, acrescentaria mais utilizadores, convidava ao desenvolvimento de jogos, e mais potenciais clientes para a loja e acessórios.
As consolas portáteis não têm futuro?
Pelas palavras dos analistas assim parece. Pelas palavras do próprio Shuhei Yoshida assim parece. Eu, contudo, não acho. E porquê? Porque não faltam produtos android que copiam o design da Vita que estão a tentar oferecer o que a Vita oferece. Porque não falta vontade do público em ter gaming tablets capazes de rodar jogos com a qualidade de uma consola de mesa. E tudo com resultados desde o muito questionável às excelentes ideias. Basta ver produtos como o nVidia Shield ou o Archos Gamepad2 (na figura), que apesar de uma performance relativamente questionável, conseguiram mercado o suficiente para terem continuações.
Mas sejamos claros, o grande entrave que Shuhei Yoshida coloca é mesmo a loja e o catálogo. A Vita pura e simplesmente não consegue fazer frente à oferta e variedade do Android que chamam cada vez mais e mais clientes. E eu com isso sou forçado a concordar. Mas a realidade é que a Sony também se deixou arrastar e não soube fazer frente à concorrência. Dividiu a lojas e segmentou a oferta por regiões (uma atitude completamente sem sentido), não garantindo nem a variedade nem a oferta que garante às consolas caseiras.
Assim sendo, fará sentido a Sony apostar numa sucessora? Os analistas pensam que não. Tanto eu como a Valve, pensamos que sim. A batalha com o Android para a Sony não está perdida, sobretudo depois do tremendo sucesso da PS4. E o Smach Zero poderá ser prova disso. Tendo sido anunciado recentemente, o Smach Zero, é um novo tablet que poderá oferecer performances impressionantes, e contará com um catálogo já de si respeitável pois será compatível, logo à partida com mais 2000 títulos presentes no Steam (usa o Steam OS). Títulos com capacidade mais que suficiente para rivalizar com o Android, e a melhor parte? Títulos que já muita gente adquiririu.
Se esta consola portátil for um sucesso (e eu espero que seja), então provar-se-á que uma sucessora da Vita será viável. Mas são necessárias bastante mudanças. Em primeiro lugar, a aposta terá de ser depositada numa APU AMD. Porque oferece melhores performances que o hardware com 4 anos da Vita e sobretudo, devido ao facto de partilhar a mesma arquitetura com o Hardware da PS4 (as últimas entregas possuem núcleos Puma+, o sucessor do Jaguar da PS4). E isto é importante pois permitirá unir as plataformas, isto é, permitirá que os jogos que rodem na portátil, rodem na consola caseira, compensando assim o investimento de quem os faz, pois os jogos serão feitas para ambas (especificamente para a portátil, mas capazes de correrem na caseira). Além disso, permitirá também, unir as lojas e garantir um catálogo para o futuro. A Sony que não se iluda. A única forma de a Playstation sobreviver é apostar numa unificação da plataforma, numa loja única e não tripartida e, daqui para a frente, garantir retrocompatibilidade com todas as suas consolas.
A consola terá que ser maior (ecrã de 6″ a 9″), mais fina, ter mais leitores de cartões de jogos e sobretudo, ter memória interna. Não deve ser desenhada para substituir smartphones, mas sim, tablets. De resto, não é preciso alterar mais nada. E penso que o momento para a lançar será agora.
Conclusão
A PS Vita é uma grande consola e vale à pena. Quem quiser comprar a consola agora, terá um catálogo de grandes títulos à disposição. Mas sofreu com a estratégia da Sony de começar uma plataforma e criar todo um ecossistema a partir dela. Isso não irá resultar daqui para a frente. Enquanto se combatia o PC, este sempre teve os defeitos associados com compatibilidade e manutenção que o impediram de ser um substituto à altura.
Mas no mercado das portáteis a história é outra. Os smartphones tornaram-se equipamentos fundamentais do dia-a-dia sem os quais as pessoas não vivem, de uso fácil e o android garante-lhe o suporte necessário. Aliado a isso, a loja conta com milhares de títulos, baratos, e a baixo custo, com uma enorme comunidade de jogadores. Para uma nova portátil conseguir ter sucesso, terá que capitalizar o esforço feito na consola caseira e isto significa ser compatível ao nível da arquitetura de modo a justificar o investimento.
Nesta perspectiva, e olhando para trás, vemos que a Vita, infelizmente, sofreu também do timing. No mesmo ano em que foi lançada a AMD começou a aventurar-se nos processadores para dispositivos móveis. Em 2013 lançou a primeira APU com o Jaguar. (pouco mais de um ano após o lançamento da Vita) e tendo em conta que no final desse ano as novas consolas foram lançadas, com a mesma arquitetura… poderia ter feito a diferença.