O que se passou com Crackdown 3?

Apesar do downgrade claro, a culpa não é totalmente de promessas infundadas, mas igualmente de situações diversas que basicamente deixaram a Microsoft numa posição muito ingrata.

Estávamos em 2005 e a Microsoft encontrava-se a desenvolver um jogo para a sua consola Xbox denominado… Crackdown.

Nessa altura a Microsoft resolver passar o jogo para uma nova plataforma, o Renderware 4, sendo que teve uma série de problemas com a conversão do motor antigo para o novo. Infelizmente, a piorar as coisas, a EA comprou a Criterion, detentora do motor, e com isso o suporte a terceiros foi cancelado, levando a que o jogo sofresse com uma série de problemas adicionais no seu desenvolvimento.

Não, não nos enganamos na versão do jogo e nem na data. Começamos com esta história de 2005 porque ela vem bastante a calhar, até porque a situação que se passou agora com Crackdown 3 deve ter soado a algo como um “deja vu” na Microsoft.

Vamos explicar então o que se passou com Este último jogo, e explicar alguns dos factores extra limitações da internet, que levaram a que o jogo final lançado em 2019 não cumprisse minimamente com o prometido nas apresentações de 2015!



Umas das razões que levaram a uma série de sonhos molhados do lado da Microsoft em 2013, apoiados em promessas mirabolantes de performances na Cloud, foi uma parceria que a empresa de Redmond realizou com uma pequena empresa denominada Cloudgine, que possuía um motor desenvolvido ao longo de vários anos, e destinado a utilizar o poder do processamento remoto de servidores que serviam para melhorar uma série de situações em jogos, recorrendo assim a poder de processamento remoto, situado na internet: O processamento Cloud!

O motor era bastante promissor, e os testes realizados internamente mostravam que o mesmo conseguir obter informação em quantidade tal que, a ser calculada localmente, mantendo as performances, obrigaria a uma capacidade de processamento superior à existente na consola. Dedicando essas capacidades totalmente à física, a Microsoft estimava que o conseguido era o equivalente a 13 consolas XBox One a processar em conjunto.

Era certamente uma ferramenta de marketing poderosa. O poder da Cloud, caso se conseguisse transportar efectivamente esta capacidade para a realidade da Internet, seria algo que cativaria muitas e muitas pessoas, e uma ferramenta super valiosa no futuro. Daí que a existência deste motor que estava a ser melhorado em colaboração entre a Cloudgine e a Microsoft, alimentasse toda a ideia de uma propaganda de uma consola que seria aumentada em performance pela Cloud.

E o motor foi sendo desenvolvido e melhorado. De tal forma que em 2015 foi apresentado na Gamescom. Num ambiente controlado e numa rede fechada, o jogo mostrou as promessas do que se pretendia e esperava poder levar ao público, e diga-se que o mostrado era efectivamente impressionante. O que se via era algo que, a passar de forma capaz para a realidade das ligações mundiais internet, e a funcionar com altas latências e larguras de banda reduzidas, poderia trazer muitas situações de inovação ao universo dos videojogos. Uma ferramenta poderosa e que a Microsoft, graças à sua rede Azure, estava em condições melhores que ninguém de explorar, obtendo assim uma posição cimeira numa inovação que se poderia revelar deveras interessante e mesmo num standard em jogos online, promovendo assim aquilo que a empresa sempre desejou, os seus clientes conectados à rede!

Apesar de não sabermos quais os resultados que poderiam efectivamente ser entregues se tudo continuasse como estava, a realidade é que subitamente a Microsoft deu-se a reviver o que já tinha experimentado com a primeira versão deste mesmo jogo.

A EPIC adquire a Cloudgine e com ela todos os direitos sobre as suas propriedades intelectuais, cortando o acesso ao motor à Microsoft!



É basicamente incrível como a Microsoft não acautelou em contrato uma protecção contra este tipo de situações! Assim como se torna quase inexplicável que a empresa, tendo feito da performance na Cloud o seu porta estandarte, não tenha ponderado adquirir esta empresa com esta tecnologia que tanto lhe interessava, ou, em caso de impossibilidade (a decisão final de venda seria sempre da Cloudgine), não tenha negociado com a EPIC a continuidade do licenciamento do motor para o seu jogo.

Quando a notícia da compra do motor Cloudengine pela EPIC veio a público, a Microsoft presta declarações referindo que isso não teria qualquer implicação no jogo, sendo que as explicações para o atraso que foram dadas se prendiam com a dificuldade em adaptar a tecnologia à Azure. Mas isso não parece corresponder à verdade (afinal a Azure é uma cloud como qualquer outra e o motor era baseado na Cloud)! A realidade é que o jogo foi entregue a outra equipa e a Microsoft apenas pode manter a tecnologia a que tinha direito pelo desenvolvimento conjunto com a Cloudgine. Segundo Jez Corden do Windows Central, apesar da Microsoft não o dizer abertamente, num sessão privada de demonstração do jogo, a equipa confidenciou-lhe que, como consequência, esta teve basicamente de refazer totalmente todo o motor do jogo, uma vez que a tecnologia base lhes foi retirada.

Essas afirmações podem ser ouvidas neste video (O video tem mais de 2 horas, mas avançamos para os minutos finais onde Jez fala sobre o jogo).

Basicamente o que se passa é que nunca saberemos o que a tecnologia Cloudgine realmente nos poderia trazer, e que partes desse motor ainda estão presentes no jogo final, mas o certo é que o que o actual crackdown 3 nos mostra é um jogo bastante diferente do prometido, e uma decepção para aquilo que se esperava do “poder da cloud”, e de algo que se equivaleria a 13 consolas Xbox One.



Teria por isso toda a lógica se a Microsoft viesse a público clarificar a situação. Mas eventualmente a ideia de vir dizer em público que a EPIC lhes passou a perna é para eles mais humilhante do que apresentar o jogo assim. Mesmo que, face ao que se previa e havia sido mostrado, isso implique uma má imagem para a promoção da computação na Cloud nas infraestruturas de mundo real da internet.

Agora o certo é que a promessa da Cloud sai mais do que queimada do meio de tudo isto, e se havia quem tivesse expectativas com ela, certamente neste momento não poderia estar mais decepcionado.

Nota final acrescentada posteriormente: Crackdown 3 continua a ser um jogo único e uma demonstração das capacidades de processamento na Cloud sem paralelo. O nível de destruição que apresenta e a física ali presente é única a um nível nunca antes visto. Convem perceber-se por isso que as frases de cima são no contexto do que foi prometido e apresentado e do que foi entregue, devendo sempre ser enquadradas nesse e apenas nesse contexto.



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