Se criticamos a Microsoft pelo facto de com as apresentações adiantadas das suas futuras Xbox esta violar as regras básicas de Marketing, prejudicando as vendas das consolas que tem no mercado, o mesmo não pode ser dito do gamepass que está a usar e a seguir à letra uma série de técnicas de Marketing destinadas a atrair o cliente, e criadas com o intuito de o tornar fiel.
Quantos de vocês já analisaram preços de várias grandes superfícies, e perceberam que aquelas que são mais populares não são efectivamente as mais baratas?
Mas se não são as mais baratas, como é que elas se tornam as mais populares? Bem, a resposta está em certas manobras de Marketing, destinadas a iludir o cliente, e que comprovadamente funcionam.
Os lideres de perda
Quando vocês recebem um panfleto de um supermercado, encontram um conjunto de produtos com preços abaixo do normal (carnes, sumos, frutas, vinhos, etc)… Produtos que não são apresentados como promoções, mas que tentam passar uma ideia de sere a regra de preços mais baratos praticados pelo supermercado estando abaixo do normalmente praticado. Estes são produtos que transmitem uma ideia de vantagem, de algo mais que aquele supermercado oferece, e que levam as pessoas a comprar no mesmo,
Esses produtos são denominados líderes de perda. Basicamente são produtos onde a relação qualidade preço está alterada para os fazer valer a pena. A qualidade mantêm-se inalterada, mas a oferta criada nos mesmos torna-se compensadora ao ponto de as pessoas mostrarem interesse em comprar naquele local.
Resumidamente falamos de produtos que pelo seu menor preço valem a pena comprar. E são estes produtos que levam as pessoas ao supermercado em questão.
Mas na realidade estes preços são uma ilusão. A aposta do supermercado, e que comprovadamente acaba por funcionar, é que o cliente que vai buscar esse produto, vai aproveitar e, uma vez lá, acaba por comprar outros produtos que não pensaria em comprar de outra forma. O corte de alguns cêntimos no preço dos líderes de perda que tornam o produto interessante, é rapidamente compensado se o cliente que se dirige ao local comprar algo mais que custe alguns cêntimos mais que em outros locais.
Basicamente estes líderes de perda são produtos subsidiados, sendo que a coisa funciona melhor se eles forem caros ou de maior consumo, que atraem a pessoa à loja, onde se espera que depois ela compre outros produtos onde o negócio já não seria vantajoso.
E isto acontece no Gamepass, com a inclusão no serviço dos líderes de perda que são os exclusivos Microsoft.
Por exemplo, Sea of Thieves é um dos produtos Líderes de Perda do Gamepass. Ele está lá para atrair a pessoa para o serviço, sabendo-se que uma vez lá, ela irá jogar outros dos jogos do serviço, mas que por si não seriam suficientes para atrair as pessoas.
Degradação de valor
O caso de cima é usado associado a algo muito normal nos videojogos, a degradação de valor.
Como se sabe os jogos, são um produto que perde o seu valor muito rapidamente, pelo que é fácil criar-se um catálogo de jogos super baratos. Daí que a Microsoft usa essa situação para reduzir o valor a pagar em royalties pela perda potencial de vendas indo buscar jogos que se revelam extremamente baratos. Jogos mais antigos ou jogos que não estão a vender.
São produtos que tem um custo de aquisição pataratismo, mas que servem para encher o chouriço, fornecendo ao cliente um catalogo mais rico e mais um jogo onde a pessoa pode investir o seu tempo.
Como é que isto funciona?
Bem, com 200 jogos no Gamepass, se cada jogo oferecesse 5 horas de jogo, teríamos ali uma oferta de 1000 horas.
Quanto tempo joga uma pessoa por dia?
Bem, varia de caso para caso, mas por exemplo, um estudo realizado no Reino Unido, refere que os trabalhadores e estudantes com 21 anos ou mais, gastam em média 1,71 horas por dia a jogar.
Se simplificarmos, por uma questão de contas, isto para 2 horas diárias, temos que, caso estas pessoas joguem absolutamente todos os dias, elas jogarão 60 horas por mês
Desta forma, um ano não chegaria para explorar tudo o que o Gamepass oferece.
De notar que isto é uma média, e toma em conta pessoas com uma vida normal e uma ocupação normal. Teremos depois pessoas mais viciadas em videojogos, que jogam muito mais que isso por dia, mas há que se tomar em conta que é a média o valor que interessa tomar em conta para uma análise destas.
A combinação dos líderes de perda com jogos adicionais obtidos por degradação de valor, são a chave aqui. Basicamente estes jogos adquiridos a baixo custo não criariam uma livraria minimamente atractiva ao cliente, que não se mostraria interessado em aderir. Mas graças à presença dos líderes de perda, as pessoas aderem e uma vez lá, acabam por consumir o restante produto, que de outra forma não lhes interessava consumir.
Tal e qual como no exemplo do supermercado.
Num exemplo mais próximo temos aquilo que os ginásios nos oferecem com as adesões livres. Muitas vezes até podemos só estar interessados em ir usar as máquinas ou a piscina, mas o facto de o Ginásio oferecer outras coisas que podemos testar livremente por esterem incluídAs no custo, leva-nos a testar mais alguma coisa, criando assim habituações adicionais em coisas que por norma à partida não nos interessariam.
É assim que jogos que de outra forma nunca nos interessariam, e que nunca seriam comprados, são jogados. É para os criadores destes jogos, de geram menor interesse algo super atractivo e interessante.
Ora é aqui que entra então outro conceito estudado em jogo, que nos faz afastar mais do exemplo do supermercado, e entrar mais no exemplo do ginásio, e na realidade observada e comprovada por estudos de outros serviços de subscrição.
A mentalidade da subscrição
Para que um esquema destes funcione, a retenção dos jogadores é essencial, daí que o conceito de subscrição apareça como uma ferramenta essencial para que a coisa possa ser um sucesso!
E porque?
Bem, os estudos realizados por sites de streaming de video, como o Netflix ou a Amazon Prime, mostram algumas realidades que se calhar poucos esperariam encontrar, mas que se comprovam como existentes.
Eis duas realidades que foram comprovadas ao longo dos anos:
- Pessoas com subscrições à muito tempo, tem menos probabilidade de cancelar a subscrição do que os novos clientes.
- Como facto estatístico todas as pessoas que mantenham as subscrições activas por mais de 3 meses possuem menor probabilidade de cancelarem a mesma. Os valores são espantosos, e mostram que quem tem a subscrição há 3 meses ou menos, possui uma probabilidade de 41% de cancelar a mesma. Mas curiosamente se esta aderia para além do terceiro mês, os estudos mostram que a probabilidade de cancelar desce para 9%.
Estes são dados estatísticos de elevadíssimo valor para quem entra neste mercado, e que mostra o interesse da Microsoft, numa fase de criação de mercado, em manter as pessoas interessadas com produtos Líderes de perda lançados em maior quantidade e qualidade do que aquela que será oferecida assim que o mercado estiver criado. E isso mesmo que tal implique perdas de receita. É um investimento!
Se o Gamepass e eventualmente o futur Xcloud serão um sucesso ou não, só o futuro dirá, mas que actualmente a Microsoft, e ao contrário do que fez no passar, segue à risca as regras e tácticas de Marketing que se comprovam funcionar, isso parece inegável. E isso face ao que já se viu no passado com o anuncio da Xbox One X com um ano de antecedência, algo que contrariava todas as regras de marketing do mercado, já mostra alguma progressão.