Há pormenores que, apesar de serem visíveis e serem descaradamente colocados à frente do jogador, não podem ser percebidos imediatamente. E tal faz parte da mestria da história de God of War.
NOTA: O artigo que se segue contêm bastantes Spoilers e não o deves ler se não acabaste o jogo.
Se jogaste God of War percebeste certamente que muitos pormenores da história só são percebidos mais para a frente com o evoluir da história. Um dos exemplos é quando a Bruxa, que na altura não sabes exactamente quem é, e que se virá a revelar ser Freya, mãe de Baldur, refere que as setas de visco são perigosas e solicita a Atreus que as destrua.
Esta situação que, na altura passa despercebida ao jogador, pensando ser apenas algo do chamado “enredo de encher chouriços”, percebe-se depois uma vez que Baldur é um Deus que não sente qualquer dor, e que não pode ser morto, sendo que o visco é a sua única vulnerabilidade, e a única coisa que o pode matar.
Trata-se de uma protecção de uma mãe a um filho, percebendo-se depois que, apesar das aparentes boas intenções de Freya com Kratos e Atreus, na realidade a sua primeira atenção é para a protecção do seu filho.
Mas se isto é algo que todos nos apercebemos quando nos aproximamos do fim do jogo, e vemos os acontecimentos desenrrolar-se, há outras situações que nos passam ao lado por não serem tão evidentes, mas que ressaltam com uma segunda ronda no jogo.
Há porém que distinguir situações, pois se numa segunda partida algumas situações antes obscuras se tornam evidentes, outras apenas levantam questões que não existiam antes, necessitando de pesquisa. Irei dar dois exemplos, um para cada um destes casos!
Por exemplo, a determinada altura na historia, Kratos, Atreus e Mimir falam com a Serpente do Mundo, Jörmungandr, que refere que a voz de Atreus lhe soa familiar. Na altura a situação é explicada com uma parte da mitologia segundo a qual numa batalha entre Jörmungandr e Thor, este último atinge a serpente com tal força que esta viaja para trás no tempo, sendo que Mimir usa essa viagem para explicar a situação dizendo que, devido a isso, provavelmente a Serpente está a reviver o atual encontro.
Mas na realidade há muito mais! Apesar de tal precisar de alguma pesquisa, o final de God of War revela-nos que Atreus possui um segundo nome que lhe foi dado pela sua mãe, uma gigante. E que esse nome é Loki!
Ora Loki na Mitologia Nórdica é uma personagem muito rica! E apesar de não ir desenvolver aqui a situação pois não sabemos como God of War vai pegar na personagem, Loki é nessa mitologia, o pai de Jörmungandr.
Naturalmente que um humano ser o pai de uma serpente parece demais, mesmo para God of War, daí que acreditamos que caso o jogo pegue nisso acrescentará aqui alguma variante tal como um feitiço que transforma Jörmungandr em serpente, ou então retirando-lhe a paternidade, tornando a serpente um animal de estimação de Loki ou algo assim.
Seja como for, tome lá a história o rumo que tomar, a relação entre Loki e Jörmungandr fica logo aqui assente que existirá! E este é um pormenor que só percebemos que existe ao termos consciência de situações que o jogo esconde à vista de todos, mas que neste caso requer algum conhecimento da mitologia em causa.
Já um outro caso, este bem mais flagrante e perceptível, tem a ver com o facto porque Baldur vai a casa de Kratos, porque motivo eles batalham, e explica mesmo as frases que Baldur usa na conversa que, apesar de não serem nada estranhas quando ouvidas pela primeira vez, ganham um segundo sentido completamente diferente quando a história encaixa.
Quando jogamos pela primeira vez e Baldur nos aparece, não temos qualquer ideia de quem ele é. Aliás ele é referido como”o Estranho”. Mas essa situação altera-se durante o jogo, e sabemos depois que ele é um Deus filho de Odin, irmão de Thor.
Ora quando este Estranho bate à porta da casa de Kratos, há uma conversa em que ele refere (e não estranhem, mas joguei com as vozes originais e não com traduções):
There’s no use hiding anymore. I know what you are.
Traduzindo, o Estranho refere: “Não há qualquer utilidade em continuares a esconder-te. Sei o que és“
Naturalmente aqui nada soa a estranho. Kratos estava afastado do mundo, basicamente escondido do mesmo. E a frase sei o que és, neste contexto, refere-se ao conhecimento de que o Estranho saberia que Kratos é um Deus, ou até mais, um animal conhecido como o Deus da Guerra.
Acrescenta ainda:
I thought you’d be bigger
Que se traduz como “Pensei que serias maior“
Algo que também não soa a estranho… Poderia ser uma mera referência devido ao facto de Kratos ser não só um Deus da Guerra, mas igualmente por ter morto todos os Deuses do Olimpo.
E acrescenta:
Long way from home, aren’t you?
Ou seja “Estás muito longe de casa, não estás?“, algo que se aceita como uma referência à terra Natal de Kratos, Esparta!
E para terminar:
Thought your kind was supposed to enlightened, so much better than us, so much smarter.
“Pensei que a vossa espécie era supostamente iluminada, muito melhor que nós, muito mais esperta”, algo que associamos à cultura grega e a uma comparação entre os Deuses Nórdicos e os Gregos.
Mas no entanto, com o desenvolver da historia ficamos a conhecer o estranho. E ficamos a saber que Odin o encarregou de procurar “um Gigante” que Odin não estava a conseguir encontrar.
Ora o interessante aqui é que Baldur não sabia o sexo deste gigante, ou que ela tinha morrido! E como tal não sabia que na realidade estava a procurar a defunta mãe de Atreus, uma gigante. Daí que quando lhe aparece Kratos, Baldur toma-o como sendo o gigante em causa, e percebendo-se isso as frases de cima tomam um segundo sentido completamente diferente!
Assim temos:
“Não há qualquer utilidade em continuares a esconder-te. Sei o que és“
Refere-se ao facto de o gigante andar escondido de Odin. Sei o que és, refere-se naturalmente a ser um gigante!
E isso é reforçado quando é dito:
“Pensei que serias maior“
Naturalmente, quando Baldur procurava um gigante, a ideia dele ser maior seria coerente!
Da mesma forma a frase:
“Estás muito longe de casa, não estás?“
Referia-se ao facto de a gigante estar em Midgar e não em Jotunheim, a terra dos gigantes
“Pensei que a vossa espécie era supostamente iluminada, muito melhor que nós, muito mais esperta”
Afinal esta era uma referência aos gigantes e não aos Gregos.
Basicamente, depois de sabermos a real história, percebemos aqui que as frases de Baldur nunca foram destinadas a Kratos, mas sim à mãe de Atreus, Faye.
Este jogo duplo de palavras é uma outra mestria da equipa de God of War. Sem revelar a real história, nada é escondido do jogador. Agora para a completa percepção do que é dito, torna-se necessário avançar no jogo. Neste caso, dado que estas frases são muito iniciais e caem no esquecimento, até porque parecem fazer pleno sentido, a percepção deste segundo sentido só surge quando se joga novamente.